Os contadores e empresários brasileiros tiveram uma boa notícia na semana passada com a assinatura de um decreto que dispensa as juntas comerciais da obrigação de realizar a autenticação de livros contábeis para aqueles documentos enviados por meio eletrônico via Sistema Público de Escrituração Digital (Sped) à Receita Federal. A medida consta no Decreto nº 8.683 da Presidência da República, publicada no Diário Oficial da União do dia 25 de fevereiro, e irá conferir maior agilidade a um processo razoavelmente simples, mas que, atualmente, é bastante vagaroso.
O período entre a chegada dos livros à Receita Federal por meio da transmissão da Escrituração Contábil Digital (ECD) até sua análise (também em ambiente digital) pela Junta Comercial do Estado do Rio Grande do Sul (Jucergs), por exemplo, pode demorar até três meses. Atualmente, o órgão acumula cerca de 140 mil livros contábeis em ambiente digital aguardando análise. Já os livros “físicos”, por mais paradoxal que seja, estão em dia. Em São Paulo, na maior Junta Comercial do Brasil, o número de processos à espera de análise chega a 1 milhão.
As dificuldades variam de um estado para outro. No Rio Grande do Sul, a Jucergs atribui a lentidão no processo à falta de um sistema rápido e confiável que conecte os dois órgãos, uma vez que o Sistema de Autenticação da Escrituração Digital (Saed) gaúcho sequer saiu das fases de testes e nunca foi entregue. A consequência é que Jucergs consegue liberar apenas cinco livros por dia.
Além da maior rapidez no processo, a expectativa é que o fim da autenticação de livros contábeis físicos renda uma economia de R$ 480 milhões por ano, valor estimado pelo Programa Bem Mais Simples Brasil. “Só com as taxas, teremos R$ 333 milhões de economia. Se contarmos os gastos com a impressão, serão mais R$ 100 milhões”, destaca o presidente do Conselho Deliberativo do programa, Guilherme Afif Domingos, que também preside o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).
A redução da burocracia existente no processamento da ECD é um pedido do Programa Bem Mais Simples desde o ano passado. Ela representa mais uma ação do governo federal na tentativa de simplificação do ambiente de negócios do País. “Os projetos visam a tirar o Brasil de métodos medievais e trazê-lo para a era digital. É eliminar burocracia que não faz nenhum sentido no mundo digital”, define Afif.
O ministro do Planejamento, Valdir Simão, ressalta que o programa tem como objetivo identificar e eliminar a burocracia, que impacta nas transações comerciais do País. “Essa agenda dialoga com a retomada de crescimento e geração de emprego”, argumenta Simão, ao destacar que a meta é fazer com que a redução da burocracia se reflita em um melhor posicionamento do Brasil do ponto de vista de competitividade.
Criado há pouco mais de um ano pelo governo federal, o programa Bem Mais Simples Brasil tem como meta melhorar a eficiência da gestão pública e a vida do cidadão. O primeiro passo foi dado no ano passado, com o lançamento do Portal Empresa Simples e o Sistema Nacional de Baixa Integrada de Empresas, que possibilitou a baixa automática de empresas. A Secretaria da Micro e Pequena Empresa tirou a obrigatoriedade de apresentação das certidões negativas de débitos tributários, previdenciários e trabalhistas nas juntas comerciais. Com isso, as empresas passaram a pedir a baixa de seus registros e inscrições imediatamente após o encerramento de suas operações.
Jucergs teme perdas na arrecadação
Se entre contadores e empresários os benefícios da mudança podem ser considerados uma unanimidade, para o presidente da Junta Comercial do Rio Grande do Sul (Jucergs), Paulo Roberto Kopschina, ela traz certa preocupação. A desburocratização, nesse caso, irá acarretar em perda de receita para o órgão e forçará uma adaptação das despesas em geral.
“Estamos estimando perda de receita em torno de R$ 3 milhões anuais. Por outro lado, se vamos ter menor arrecadação, podemos ter também uma diminuição de custos”, diz o dirigente. Uma instrução normativa deve ser publicada nos próximos dias regulamentando a autenticação dos livros contábeis no primeiro ano da empresa, que até então era responsabilidade das Juntas Comerciais.
Kopschina concorda que está na hora da desburocratização, de facilitar a vida do empresário e daqueles que desejam empreender. “Evidentemente, nós vamos nos adaptar. Estamos fazendo cálculos e sabemos que é uma iniciativa para melhorar”, complementa.
Receita Federal centralizará processos do Sped Contábil
A medida que resultou no Decreto nº 8.683 foi anunciada após reunião da presidente Dilma Rousseff com representantes do Programa Bem Mais Simples. Os livros já vinham sendo encaminhados à Receita Federal por meio do envio da Escrituração Contábil Digital (ECD), parte integrante do Sistema Público de Escrituração Digital (Sped).
Com a mudança, ficará a cargo do Fisco realizar a autenticação dos documentos entregues em formato digital. Às Juntas Comerciais de cada estado caberá a publicação das decisões no Diário Oficial do Estado (DOE) e registro de abertura e fechamento das empresas. Desde 2009, as empresas tributadas pelo lucro real estão obrigadas a transmitir, via Sped Contábil, seus livros diários, razão, balancetes diários, balanços e fichas de lançamento comprobatórias das notas transcritas.
“Esse decreto acaba com a obrigatoriedade do livro contábil para quem está no Sistema Público de Escrituração Digital (Sped). Para quem não está, esse é um bom motivo para passar a integrar o sistema digital”, defende o presidente do Conselho Deliberativo do Programa Bem Mais Simples Brasil, Guilherme Afif Domingos.
As sociedades simples e as microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional estão dispensadas desta obrigação. Contudo, a questão da obrigatoriedade de publicações de micro e pequenas empresas em jornais de circulação nacional ainda é uma questão em aberto, lembra Afif, ao informar que o tema será debatido nas próximas reuniões do Conselho Deliberativo.
Além de acatar o pedido do Brasil Mais Simples, a presidente Dilma Rousseff afirmou, em reunião com representantes do programa, que encaminhará ao Congresso Nacional projetos de lei em regime de urgência que desburocratizam a legislação de armazéns gerais e da profissão dos tradutores juramentados e leiloeiros.
Os tradutores passariam a conseguir autorização para trabalhar sem concurso, e poderiam atuar em mais de um estado. Já leiloeiros teriam autorização para exercer a atividade nos fins de semana. Os armazéns gerais, por sua vez, passariam a registrar movimentos de entrada e saída uma vez ao ano, em vez do registro trimestral.
A resolução do Mercosul para simplificação de procedimentos aduaneiros, por sua vez, cria um sistema simplificado de aduana entre os países. “Essa iniciativa facilitará muito a entrada de micro e pequenas empresas no comércio internacional”, ressalta Afif. Para o dirigente, essas iniciativas visam a tirar o Brasil de “métodos medievais e trazê-lo para a era digital”, o que só será possível ao eliminar a burocracia.
Decreto Nº 8.683, de 25 de fevereiro de 2016
Altera o Decreto nº 1.800, de 30 de janeiro de 1996, que regulamenta a Lei nº 8.934, de 18 de novembro de 1994, e dá outras providências. A presidente da República, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto nos arts. 39-A e 39-B da Lei nº 8.934, de 18 de novembro de 1994, e no art. 1.181 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, decreta:
Art. 1º O Decreto nº 1.800, de 30 de janeiro de 1996, passa a vigorar com as seguintes alterações: “Art. 78-A. A autenticação de livros contábeis das empresas poderá ser feita por meio do Sistema Público de Escrituração Digital – Sped de que trata o Decreto nº 6.022, de 22 de janeiro de 2007, mediante a apresentação de escrituração contábil digital.
§ 1º A autenticação dos livros contábeis digitais será comprovada pelo recibo de entrega emitido pelo Sped.
§ 2º A autenticação prevista neste artigo dispensa a autenticação de que trata o art. 39 da Lei nº 8.934, de 18 de novembro de 1994, nos termos do art. 39-A da referida Lei.” (NR) Art. 2º Para fins do disposto no art. 78-A do Decreto nº 1.800, de 1996, são considerados autenticados os livros contábeis transmitidos pelas empresas ao Sistema Público de Escrituração Digital – Sped, de que trata o Decreto nº 6.022, de 22 de janeiro de 2007, até a data de publicação deste Decreto, ainda que não analisados pela Junta Comercial, mediante a apresentação da escrituração contábil digital.
Parágrafo único.
O disposto no caput não se aplica aos livros contábeis digitais das empresas transmitidos ao Sped quando tiver havido indeferimento ou solicitação de providências pelas Juntas Comerciais até a data de publicação deste Decreto.
Art. 3º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 25 de fevereiro de 2016; 195º da Independência e 128º da República.
Dilma Rousseff, Dyogo Henrique de Oliveira, Ricardo Berzoini.
Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da União – Seção 1 de 26/02/2016.
Publicação: Diário Oficial da União – Seção 1 – 26/2/2016, Página 3 (Publicação Original)